Fatores contribuintes para a transformação da Companhia de Precursores Pára-quedista em Batalhão de Precursores

Autores: Cel Antoine
Quarta, 19 Fevereiro 2025
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1. Introdução

É muito importante destacar que a ideia de implantação de um Batalhão de Precursores não é nova no Exército. Trata-se do resultado de um longo processo, refinado e amadurecido ao longo de muitos anos.

Desde a criação do Pelotão de Pára-quedista Precursor (Pel Pqdt Prec, ou simplesmente “Pelotão Precursor”) em 1951 até os dias atuais, os precursores, em termos doutrinários, procuraram moldar-se e adaptar-se às diferentes conjunturas vividas pela Brigada de Infantaria Pára-quedista (Bda Inf Pqdt) e pelo próprio Exército. Tudo com a finalidade de cumprir as missões que lhes foram atribuídas nas melhores condições possíveis, com os meios (pessoal e material) disponíveis em suas respectivas épocas.

O “Pelotão Precursor” passou por sucessivas transformações ao longo do tempo. Criado inicialmente como uma fração de tropa de valor pelotão, evoluiu paulatinamente para uma Organização Militar (OM) independente, subordinada ao Comando da Brigada de Infantaria Pára-quedista. Assim, o Pel Pqdt Prec transformou-se em “Destacamento Precursor”, em 1956, em “Destacamento Precursor Pára-quedista”, em 1973 e, posteriormente, em “Companhia de Precursores Pára-quedista”, em 1988.


 

2. Desenvolvimento

Seguindo a tendência das tropas de precursores ou afins presentes em outros países, especialmente os do arco do conhecimento, e em consonância com a evolução doutrinária da Força Terrestre, o emprego do elemento precursor expandiu-se com o decorrer do tempo. Além de suas missões e atribuições tradicionais (Operações Aeroterrestres e Operações Aeromóveis), novas possibilidades e capacidades foram incorporadas.

Nesse contexto, destacam-se as ações de Inteligência, Reconhecimento, Vigilância e Aquisição de Alvos (IRVA), com o emprego de caçadores e de sistemas de aeronaves remotamente pilotadas (SARP) em missões de combate e de reconhecimento, cada vez mais necessárias no campo de batalha moderno. Essa evolução foi comprovada pela ativação, em 2016, de um Destacamento Precursor com essa destinação na estrutura organizacional da Cia Prec Pqdt. Posteriormente, esse Destacamento foi denominado Destacamento de Reconhecimento e Vigilância (DRV), composto apenas de oficiais e sargentos e já testado em missões reais em proveito da Bda Inf Pqdt e de tropas de outros Comandos Militares de Área (C Mil A), além do Comando Militar do Leste (CML).

Ressalta-se que, mesmo antes da ampliação dessas novas capacidades, a Cia Prec Pqdt já enfrentava dificuldades para cumprir suas missões típicas relacionadas às Operações Aeroterrestres em proveito da Bda Inf Pqdt, considerando a estrutura organizacional existente. Esse fato evidenciava a necessidade de sua transformação em uma OM valor Batalhão. Além disso, a complexidade das operações militares na atualidade demandava um maior nível decisório e um assessoramento mais qualificado por parte do Cmt Cia Prec Pqdt ao Cmdo Bda Inf Pqdt, indicando a necessidade de nomeação de um oficial superior do QEMA como Cmt OM.

A partir dos anos 2000, a ideia do Batalhão de Precursores ganhou grande impulso devido a diversos fatores que contribuíram para a transformação da Companhia de Precursores Pára-quedista em Batalhão de Precursores. Esses fatores, em ordem cronológica, são:

1. Pesquisas e trabalhos monográficos de alunos da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO) e da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME) possuidores do Curso de Precursor, abordando temas relacionados à modernização e à evolução da especialidade. Destaca-se a monografia intitulada “A Companhia de Precursores Pára-quedista: uma proposta de modificação em sua estrutura”, de autoria do então Major Vasconcellos, aluno do Curso de Comando e Estado-Maior (CCEM) no período 2000-2001.

2. Alteração da Portaria do Curso de Precursor Paraquedista em 2005, permitindo que militares de OM não orgânicas da Bda Inf Pqdt, desde que possuidores do curso básico paraquedista e servindo em qualquer Comando Militar de Área, pudessem realizá-lo. Essa mudança aumentou significativamente o universo de voluntários e, consequentemente, o número de militares formados. O primeiro curso sob essa nova concepção ocorreu em 2006.

3. Atualização da Doutrina Militar Terrestre (DMT) e modernização das operações militares mediante o Planejamento Baseado em Capacidades (PBC), a partir de 2010, permitindo a quebra de paradigma e o emprego de tropas detentoras de determinadas capacidades operativas em proveito de tropas de outras naturezas, organizadas modularmente, subordinadas ao mais alto escalão em presença (Comando Conjunto, Corpo de Exército, Força Terrestre Componente, etc) e cumprindo missões e tarefas de nível tático, operacional e estratégico. Com isso, os Destacamentos e Equipes da Cia Prec Pqdt passaram a ser empregados1 fora da Bda Inf Pqdt2.

4. Estudos conduzidos por sucessivos Grupos de Trabalho (GT) entre os anos de 2013 e 2016, compostos por oficiais, subtenentes e sargentos precursores da Bda Inf Pqdt, alunos da ECEME e outros especialistas. O objetivo era analisar profundamente os aspectos doutrinários da especialidade, concluindo pela criação de uma OM de precursores valor Unidade (Batalhão de Precursores - B Prec) por meio da transformação da Cia Prec Pqdt. A proposta foi enviada ao Estado-Maior do Exército (EME) no final de 2016.

5. Simpósio de Precursores conduzido pela Bda Inf Pqdt em 2018, abordando a necessidade de atualização doutrinária da especialidade, incluindo a criação do B Prec em um contexto de ampla modernização das operações militares e da DMT.

6. Elevação da antiguidade e da especialização do comandante da Cia Prec Pqdt em 2018, com a nomeação do primeiro oficial superior do QEMA para o cargo no biênio 2019/2020 e a alteração do Quadro de Cargos Previstos (QCP) da OM para acomodá-lo.

7. Ativação de um GT conjunto entre a Cia Prec Pqdt e o Curso de Precursor (CI Pqdt GPB) em 2019, multidisciplinar, relatado pelo Cmt Cia Prec Pqdt, para conduzir um amplo estudo da especialidade e revisar a proposta de criação do B Prec enviada ao EME em 2016. O estudo foi conduzido com base no acrônimo DOAMEPI (Doutrina, Organização, Adestramento, Material, Educação, Pessoal e Infraestrutura). Esse GT proporcionou algumas conclusões, entregas e resultados, a saber:

a) revisão da grade curricular e dos documentos de ensino do Curso de Precursor Paraquedista do CI Pqdt GPB, a fim de modernizar a formação desse especialista e adequá-la às demandas operacionais da Força Terrestre;

b) revisão completa do Quadro de Organização (QO) da Cia Prec Pqdt e seus documentos (Base Doutrinária, QC, QCP, QDM, Plano de Equipamentos Específicos, etc.). Ao término dessa etapa, percebeu-se a necessidade da realização de um passo intermediário, considerado fundamental no processo de transformação Cia-Btl, qual seja, a modernização, primeiro, da Cia Prec Pqdt, para absorver as novas capacidades que lhes foram agregadas nos últimos anos, mas que ainda não constavam do QO, defasado pelo tempo. Uma vez modernizada, a OM valor SU serviria de plataforma para o próximo passo a ser dado, ou seja, a transformação da Cia Prec Pqdt em B Prec, facilitando as ações futuras;

c) fruto da revisão supracitada, em 2020 o EME autorizou o acréscimo de 66 cargos no efetivo previsto do QCP da Cia Prec Pqdt, permitindo, dentre outras ações, a implantação do Destacamento de Reconhecimento e Vigilância (DRV), incrementando a capacidade operacional da OM, e o aumento qualitativo e quantitativo do Estado-Maior da OM, possibilitando o emprego mais longevo do especialista precursor com militares mais antigos e experientes;

d) aperfeiçoamento da especialidade no nível dos cabos e soldados auxiliares de precursor, por meio da criação de uma Qualificação Militar específica (QM 0401 Auxiliar de Precursor), e da transformação do Treinamento Específico de Auxiliar de Precursor (Trn Epcf Aux Prec) em Curso de Formação de Cabo/Soldado Auxiliar de Precursor (CFC Aux Prec), com Programa-Padrão próprio. Essas medidas, aprovadas pelo Comando de Operações Terrestres (COTER) e desencadeadas a partir de 2020, permitiram a evolução da capacitação desses especialistas sob vários aspectos, trazendo, inclusive, mais segurança jurídica;

e) realização de um Simpósio de Precursores conduzido pela Bda Inf Pqdt em 2020, sobre o especialista precursor e seu emprego no combate moderno, patrocinado pelo Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx), com o apoio do EME e do COTER, com ampla participação de distintos atores, incluindo as forças coirmãs, as forças de segurança pública, veteranos e experientes precursores, estudiosos do assunto e editores de revistas especializadas, visando à modernização da especialização e de sua estrutura organizacional, em perfeito alinhamento com o processo de transformação da Força Terrestre;

f) escrituração do Manual de Campanha “Companhia de Precursores Paraquedista”, publicado em 2022 em sua 1ª edição, que contemplou todos os aspectos doutrinários estudados e amadurecidos nos anos anteriores, especialmente após as discussões ocorridas no Simpósio do DECEx de 2020;


 

g) Mudança de sede, por troca direta com a 21ª Bateria de Artilharia Antiaérea Pára-quedista em 2021, o que trouxe benefícios efetivos para ambas as OM. Tal mudança decorreu, sobretudo, da necessidade de ampliação do espaço patrimonial disponível para a expansão das instalações, a fim de acomodar o efetivo e os novos e modernos materiais de emprego militar (MEM) por receber ou existentes na OM;

h) realização do CFC Aux Prec com a inclusão de cabos e soldados de OM não orgânicas da Bda Inf Pqdt em 2022, o que fez aumentar consideravelmente o número de voluntários, inclusive não paraquedistas, permitindo ampliar a formação desses especialistas, mantendo-se a qualidade desses recursos humanos; e

i) aprovação, em versão experimental, do Programa-Padrão Básico de Adestramento da Cia Prec Pqdt em 2024, o que contribuiu para a sistematização das atividades de adestramento da OM.

8. Novo Conceito Operacional do Exército Brasileiro - Operações de Convergência 2040, que definiu fundamentos, cenários e conceitos para nortear o preparo e emprego da Força Terrestre 40. Nesse recorte, o atual Plano Estratégico do Exército enquadrou a Cia Prec Pqdt como umas das OM componentes das Forças Especializadas de Emprego Estratégico, fruto de suas capacidades operativas ímpares, reforçando a necessidade de sua transformação em Batalhão.


 

3. Conclusão

Em 2024, o Exército Brasileiro, atento à conjuntura e à sua nova Concepção Estratégica, decidiu transformar a Companhia de Precursores Pára-quedista em Batalhão de Precursores, mantendo-o orgânico da Brigada de Infantaria Pára-quedista. Essa decisão está perfeitamente alinhada ao processo de transformação da Força Terrestre em curso, sustentado pelos seguintes Programas Estratégicos: Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (SISFRON); Modernização do Sistema Operacional Terrestre (SISOMT); Sentinela da Pátria; e Obtenção da Capacidade Operacional (OCOP).

A transformação foi oficialmente efetivada a contar de 31 de janeiro de 2025, conforme a Portaria C Ex Nº 2.419, de 29 de janeiro de 2025.

A transformação da Cia Prec Pqdt em B Prec trará uma série de benefícios para o Exército Brasileiro, incluindo: a otimização do emprego de pessoal altamente especializado (Precursores e Auxiliares de Precursor) e de material de emprego militar de alto valor agregado, presentes na OM; ampliação da capacidade operacional e do poder de combate da Brigada de Infantaria Pára-quedista e das Forças Especializadas de Emprego Estratégico; e maior projeção de poder e dissuasão da Força Terrestre.

Por fim, a nova OM carrega consigo as tradições e o legado iniciado pelos “Pioneiros”, honrado por gerações de Precursores e Auxiliares de Precursor ao longo do tempo. Precede, Guia e Lidera!

1 Por exemplo: segurança nos grandes eventos (Copa do Mundo FIFA 2014 e Jogos Olímpicos e Paraolímpicos Rio 2016); Operação São Francisco, no Complexo da Maré, em 2014; e Operação Capixaba, no Espírito Santo, em apoio ao Comando Conjunto na manutenção da segurança pública daquele Estado, em 2017. Destaca-se a atuação das frações de precursores na Operação Arcanjo, em apoio à Bda Inf Pqdt e a outras Grandes Unidades em operações de garantia da lei e da ordem (Op GLO) nos Complexos do Alemão e da Penha no ano de 2010, e no ano de 2018, na Intervenção Federal no Rio de Janeiro. Mais recentemente, a Cia Prec Pqdt participou de operações interagências, realizando ações de reconhecimento e combate na Faixa de Fronteira em proveito do maior escalão em presença nas Operações Ágata Fronteira Oeste II (Mato Grosso e Paraná), Catrimani e Ágata Amazônia (Roraima e Amazonas), além de ações de ajuda humanitária, por ocasião da Operação Taquari II (Rio Grande do Sul) em 2024.

2 Historicamente, os precursores já haviam sido empregados em proveito de tropas não-orgânicas da Bda Inf Pqdt, cumprindo missões não ortodoxas, diferenciadas daquelas cumpridas por outras tropas do Exército à época. Por exemplo, nas décadas de 50 e 60 o Pelotão/Destacamento Precursor atuou em missões de busca e salvamento de aeronaves acidentadas em território nacional, em uma época em que o PARA-SAR da FAB ainda não existia.

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Parabéns, meu amigo,  pelo excelente e esclarecedor texto. Precede, Guia e Lidera!

Muito obrigado, amigo Del Duca! Aeromóvel!!!

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