ENDEFORTE: perspectivas para o futuro da Defesa e do desenvolvimento do Brasil

Autor: Major Pacheco

Sexta, 05 Julho 2024
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No cenário global contemporâneo, caracterizado pelos desafios de coexistência entre potências tradicionais e emergentes, a Defesa Nacional é um aspecto fundamental para a preservação da soberania e dos interesses de uma nação. Nesse contexto, a criação da Empresa Nacional de Desenvolvimento da Força Terrestre (ENDEFORTE) emerge como importante ferramenta para a consecução dos Objetivos Estratégicos do Exército Brasileiro (EB), em conformidade com a Política Nacional de Defesa (PND) e a Estratégia Nacional de Defesa (END). Num país de dimensões continentais, que possui presença estratégica na América do Sul, iniciativas como esta são primordiais para a consolidação e o fortalecimento da Base Industrial de Defesa (BID) brasileira, contribuindo para a projeção do País a nível internacional e para o desenvolvimento socioeconômico e científico-tecnológico no âmbito doméstico.

A diretriz de iniciação do Projeto de implantação da ENDEFORTE se materializou com a publicação da Portaria – EME / C Ex Nr 1.268, de 05 de março de 2024. A empresa será vinculada ao Ministério da Defesa, por intermédio do Comando do Exército, com sede em Brasília (DF), e contribuirá para o atingimento de oito dos onze Objetivos Estratégicos do Exército previstos na Política Militar Terrestre (2023), além de Diretrizes do Comandante do Exército (2023-2026), possibilitando o desenvolvimento de projetos alinhados ao Portfólio Estratégico do EB.

A Base Industrial de Defesa compreende um conjunto de indústrias e empresas voltadas ao processo de produção e manutenção de produtos de Defesa, como aeronaves, navios, veículos terrestres, armamentos e sistemas de comunicação. Sua existência é cardeal para garantir a capacidade brasileira de se proteger face a ameaças externas e de participar ativamente de operações de paz regionais e globais. No caso específico do Brasil, a geografia única do País, com extensa fronteira terrestre e longa faixa litorânea, bem como vastas áreas de recursos naturais estratégicos, torna imperativo o fortalecimento de sua BID, o que pode ser impulsionado com a criação da ENDEFORTE, estimulando a inovação, promovendo a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias avançadas e, atraindo um potencial mercado consumidor de Produtos de Defesa (PRODE).

O binômio BID-ENDEFORTE, nesse sentido, tem potencial para desempenhar um papel crucial no fortalecimento da capacidade operacional do EB. A concentração de esforços no desenvolvimento e na produção de equipamentos, sistemas e tecnologias voltadas para o Exército possibilitará que a Força Terrestre esteja adequadamente equipada e preparada para enfrentar os desafios de Defesa e Segurança do século XXI, num mundo precipitado, superficial, imediatista e conturbado (PSIC1). Isso inclui desde a modernização de armamentos e veículos até a concepção de sistemas de comunicação e inteligência estratégica. O grande diferencial, entretanto, está no fato da ENDEFORTE ser concebida na forma de empresa estatal não dependente, ou seja, uma empresa pública que possui autonomia financeira e operacional, sendo capaz de gerar receitas suficientes para cobrir seus custos e investir em suas atividades, sem depender exclusivamente de financiamento público para suas operações.

Existem inúmeros benefícios potenciais para o Brasil, a partir da criação da ENDEFORTE. Ao fomentar a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação, a empresa estimulará o avanço da ciência e da tecnologia e o crescimento de setores estratégicos da economia, além de fortalecer a capacidade militar nacional. Investindo em infraestrutura e tecnologia, a empresa pode impulsionar a estruturação de clusters industriais voltados para a defesa, atraindo investimentos e alavancar a inovação em setores relacionados, o que tende a promover um transbordamento (spillover2) para outros setores, como o aeroespacial, o de telecomunicações e o de alta tecnologia, criando um círculo virtuoso para promoção do desenvolvimento industrial e tecnológico do País.

Ainda, a implementação dessa estratégia tende a fortalecer a autonomia e a soberania do Brasil, reduzindo a dependência de importações de equipamentos militares e tecnologias sensíveis. Vislumbra-se que o País tenha controle sobre seus meios de defesa e diminua a vulnerabilidade face a pressões externas em momentos de crise, como visto recentemente em decorrência dos conflitos Rússia-Ucrânia e Israel-Hamas.

Para além dos impactos positivos já mencionados, o maior estímulo à criação da ENDEFORTE reside no potencial de gerar impactos socioeconômicos significativos para a população brasileira. Isso se reflete na criação de empregos, na capacitação e formação de mão de obra qualificada e na geração de renda, estimulando o crescimento de cadeias produtivas locais e a promoção do desenvolvimento de regiões estratégicas do País.

Em suma, a implantação da ENDEFORTE contribuirá com a ampliação da capacidade de atuação do Exército Brasileiro e permitirá a entrega de mais benefícios à sociedade, assegurando a projeção do Brasil no cenário global em virtude do fortalecimento de sua BID, de investimentos em pesquisa e desenvolvimento, do estabelecimento de parcerias público-privadas e do incremento de capacidades locais, o que contribuirá para a proteção dos interesses nacionais, a melhoria dos indicadores socioeconômicos e a promoção da autonomia e soberania brasileiras.

1 Expressão cunhada pelo General Ex Richard Fernandez Nunes para definir o entendimento sobre a dimensão informacional no mundo contemporâneo, em provocação aos já consagrados acrônimos VUCA e BANI. Ver “O Mundo em Acrônimos e a Comunicação Estratégica do Exército” (Nunez, 2022).

2 “Comportamentos que ocorrem sequencialmente e estão ligados, em um nível consciente ou inconsciente, por algum motivo subjacente” (Dolan; Galizzi, 2015, p. 1, tradução nossa).

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O presente texto foi escrito em colaboração com o Major Vianna Junior.

Segue o currículo do co-autor:

"Major Antonio João de Oliveira Vianna Junior. Aluno da Escola de Comando e Estado Maior do Exército e Doutorando em Ciências Militares pelo PPGCM - IMM - ECEME. Mestre em Administração pelo PPGA/Universidade Federal Fluminense-Polo Volta Redonda e Mestre em Ciências Militares pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais. Possui MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas e é Especialista em Docência em Licitações e Contratos. Desempenhou as principais funções nos últimos anos: Oficial de Logística da BRAENGCOY 20 na MINUSTAH, Instrutor na AMAN (2017-2018 / 2020 - 2022) e Oficial do Gabinete do Comandante do Exército."

CATEGORIAS:
Defesa

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Excelente! Quem quer ser grande, precisa desenvolver e produzir tecnologia!

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