Educação ambiental e climática no Exército Brasileiro

Autor: Coronel Raul Kleber de Souza Boeno

Segunda, 25 Março 2024
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As perdas humanas e os prejuízos materiais decorrentes dos recentes eventos climáticos extremos ocorridos no Brasil, secas no Norte e enchentes no Sul, provocam comoção nos diversos setores da população, bem como fomentam debates sobre a crise climática e seus efeitos para a humanidade.

Personalidades públicas e privadas têm debatido sobre a criação e a inclusão da Educação Climática nos currículos escolares. Especialistas de diversas áreas têm contribuído para acirrar o debate sobre o tema mencionado, apontando possíveis direções aos decisores estratégicos do País. De forma simplista, um dos principais pontos de polarização nas discussões é que, parte dos debatedores sugere uma Educação Climática de forma “pura e emergencial” e a outra parcela defende que o tema seja abordado, de forma interdisciplinar e transdisciplinar, pela já consagrada Educação Ambiental.

O objetivo desse breve contributo é trazer algumas reflexões sobre esse debate, mostrando a opção adotada pelo Exército Brasileiro, frente à questão climática na área educacional.

Inicialmente, cabe lembrar que um dos marcos legais da Educação Ambiental está na Constituição da República Federativa do Brasil (Inciso VI, do § 1º, do Artigo 255) e na Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA - Lei Nº 9.795, 27 de abril de 1999). Além disso, o tema também é normatizado por uma robusta legislação federal, estadual e municipal, significando, portanto, que um eventual debate sobre essa temática deveria ser alicerçado na legislação educacional, entre outras.

A questão climática tem sido debatida em distintas agendas, inclusive na segurança e na defesa. A respeito do envolvimento do setor militar com a questão climática, cabe pontuar que o Ministério da Defesa (MD), órgão que coordena as ações do Exército Brasileiro, da Marinha do Brasil e da Força Aérea Brasileira, está inserido nas políticas do Governo Federal. Isso significa que o setor militar desenvolve suas atividades com total alinhamento com as políticas governamentais, entre elas a Política Nacional de Mudanças Climáticas (Lei nº 12.187, 29 de dezembro de 2009).

Entretanto, o MD, antigo integrante do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIMC - Decreto nº 6263, 2007), por sucessivas decisões presidenciais (Decretos nº 10.845, 25 de outubro de 2021 e Decreto nº 11.550, 5 de junho de 2023), deixou de integrar o CIMC. Isso denota que o MD pode ser convidado para participar do CIMC, mas não pode votar nas decisões interministeriais, inclusive sobre a elaboração de planos setoriais sobre adaptação e mitigação das alterações climáticas, inclusive na área educacional.

Por outro lado, merece destaque a recente inclusão do MD na Comissão Nacional para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (Decreto nº 11.704, 14 de setembro de 2023). Isso significa que o MD poderá contribuir com a implementação da Agenda 2030 no País e desenvolver ações alinhadas com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável Nr 13 (Combate às Alterações Climáticas). Como o MD tem grande capilaridade nacional, essas ações possuem potencial de serem catalisadas por seus integrantes junto à sociedade. Como é o caso, por exemplo, dos 90 mil jovens que cumprem o serviço militar anualmente e dos 270 mil que formam o Efetivo Profissional das Forças Armadas.

As Forças Armadas têm, por tradição, o compromisso histórico com a proteção do meio ambiente, conforme demonstra o Decreto nº 14.273, de 28 de julho de 1920, bem como a qualidade ambiental dos campos de instrução militares e áreas sob sua responsabilidade. No MD existe uma razoável quantidade de publicações institucionais que fornecem procedimentos e diretrizes para as Organizações Militares sobre a questão climática e ambiental. Sobre isso cabe pontuar que, particularmente na América do Sul, até o início do século XXI, a conjuntura (política, social e econômica) conduziu à discussão sobre o clima, quase que exclusivamente para a agenda ambiental. Assim, existem várias orientações institucionais sobre mudanças climáticas que estão “pulverizadas” nas publicações de cunho ambiental.

No caso do Exército Brasileiro, a abordagem mais relevante sobre a Educação Ambiental está no documento chamado “Instruções Reguladoras da Educação Ambiental no âmbito do Departamento de Educação e Cultura do Exército” (EB60-IR-57.011, Portaria nº 01-DECEx, 31 de janeiro de 2019). Segundo essas IR, a Educação Ambiental deve ser desenvolvida em cinco enfoques: Naturalista, Operacional, Jurídico, Socioambiental e Defesa e Segurança.

Da definição conceitual desses enfoques (disponível em: https://www.decex.eb.mil.br/images/pdfs_2020/001_DECEx_2019_IR_11_edu_ambiental.pdf), percebe-se que a questão climática também pode ser abordada no âmbito escolar da mesma forma, se aproximando e cristalizando o que pontuamos inicialmente como Educação Climática.

Um dos centros nevrálgicos da questão climática é a dificuldade em promover uma mudança da relação do homem com o ambiente, bem como tornar cidadãos conscientes do uso sustentável dos recursos fornecidos pelo ambiente (consumo consciente da finitude de recursos, em especial as fontes não renováveis). Isso vai ao encontro do próprio conceito da Educação Ambiental que é justamente construir indivíduos e uma coletividade com valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente (bem de uso comum do povo), essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (PNEA).

A IR-57.011 é uma das mais completas orientações que tratam da questão climática, sob o enfoque da Educação Ambiental, e suas implicações para a segurança no âmbito do Exército Brasileiro (EB). Assim, todas as escolas militares do EB que tratam de ensino assistencial e preparatório, formação, especialização, aperfeiçoamento e altos estudos podem abordar o tema “mudanças climáticas” de forma transversal e interdisciplinar em todos os seus cursos e estágios. Os anexos A e B dessas IR aprofundam o debate sobre a questão climática e a militarização dos desastres, bem como fornecem subsídios para o tema ser trabalhado nas escolas mencionadas.

Além do mencionado, cabe lembrar que outros pontos precisam ser trazidos ao debate, tais como a valorização dos professores, a integração com Educação em Redução de Riscos e Desastres (ERRD), o incremento de entidades educacionais com capacitação e expertise em sustentabilidade, o fomento de incentivos estruturais para as escolas (energia solar e espaços verdes), a destinação de linhas de crédito específicas para as escolas, entre outros aspectos com potencial de fortalecimento da Educação Ambiental.

Assim, considerando que a escola é um vetor de transformação da sociedade e que o denominador comum da Educação Climática e da Educação Ambiental é justamente a conscientização do cidadão sobre sua relação com o ambiente, particularmente sobre a sustentabilidade e o consumo consciente e responsável, percebe-se que o debate sobre a inserção da Educação Climática nos currículos escolares carece de maiores aprofundamentos, sendo razoável inferir que o Exército Brasileiro, desde 2019, já tem tratado da questão climática em todas as suas escolas, de forma transversal e interdisciplinar, sob o escudo da Educação Ambiental como uma “ferramenta de conscientização”.

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Geral Meio Ambiente

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