Adjunto de Comando: visão de um ex-comandante

Autor: Coronel Maurício Gröhs

Quarta, 26 Junho 2024
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Dois anos à frente de uma organização militar: o primeiro, com adjunto de comando; o segundo, sem. Fez falta! Apresento minhas percepções, que inclusive serviram de base para a justificativa de retorno deste importante cargo ao 4º Depósito de Suprimento.

Este texto é baseado na experiência prática e, acima de tudo, trata de liderança.

Imagine um dia tranquilo de trabalho, despachos de rotina, demandas corriqueiras... De repente, alguém irrompe no PC: “comandante, temos uma situação”. Era o adjunto de comando, solicitando sua gestão direta em dado assunto. Isto nem sempre ocorria, pois muitas vezes, ele solucionava potenciais crises na origem, sem que você percebesse.

Devagarinho, pela sombra”, atuando no “chão de fábrica”, ele estabelecia uma ponte entre a tropa e o comando, eliminando ruídos: difundindo a intenção do comando por um lado; trazendo demandas e sugestões de melhorias na gestão por outro (não raro, contribuições relevantes que não chegariam pelo canal de comando formal).

Um trabalho silencioso e dedicado, de imensurável valor, que contribui sobremaneira para a coesão, o espírito de corpo e o aperfeiçoamento de processos e da atividade-fim, “levando em consideração o ponto de vista e a experiência dos graduados. Estes são princípios básicos que regem o cargo.

Sábio aquele que tiver humildade para aceitar o assessoramento de subordinados. Sábio aquele que tiver humildade para não se deixar levar pela vaidade no cargo.

Considero a humildade um dos pilares mais importantes da liderança. Jim Collins, em Empresas feitas para vencer, a identificou como qualidade central em líderes que levaram grandes empresas à excelência. Muito antes, alguém escreveu: “antes da honra está a humildade” (Provérbios 15:33).

Não ter “o prestígio e a zona de conforto como foco”, diz o Guia do Adjunto de Comando. Não se trata de mera distinção, de uma ‘Medalha de Praça Mais Distinta’. Se houver, porventura, aqueles que ostentam o distintivo sem incorporar suas responsabilidades, não caiamos no erro de condenar a ideia em função dos que a desvirtuam.

Um militar altamente capacitado que “vaga pelo quartel sem função”, assim ouvi em reunião de Estado-Maior. “É preciso dar uma função a ele”. Um ano e meio depois, todos concordavam que fazia falta (oficiais e praças).

É justamente a liberdade de ação que faz dele detentor de informações que escapam aos demais, especialmente ao Estado-Maior. Dados valiosos para decisões que, sem informação completa, correm o risco de se afastar do fator humano. Não à toa, o adjunto de comando integra o Estado-Maior Especial da OM.

Coesão, espírito de corpo, cadeia de comando, bem-estar do pessoal; concordo que tudo isso deve ser preocupação de todos, mesmo sem o adjunto de comando. “As coisas sempre andaram bem sem eles”, dirão os que resistem à mudança. Por que, então, sou defensor do cargo?

Somos altamente demandados por acúmulo de atribuições técnicas, comissões e escalas, entre outros. Imagine isto em um órgão provedor regional e nacional com dois aquartelamentos, 330 militares, sendo 100 do efetivo variável. Em dois anos, 45% de rotatividade no efetivo profissional.

Elevada descentralização, cada pelotão se divide em inúmeras pequenas frações para as missões diárias. Há falta de contato aproximado e constante, o que dificulta a formação de vínculos de confiança entre superiores e subordinados, fazendo com que estes não tenham suas ideias levadas adiante. O Adj Cmdo atua justamente nesta lacuna, fortalecendo a cadeia de comando.

Outro aspecto é o elevado efetivo de técnico-temporários, com pouco tempo de formação militar e, não raro, incorporando ao Exército junto aos soldados. A muitos deles escapam atributos necessários ao líder de pequena fração. A rotatividade potencializa este aspecto, gerando no quartel a presença contínua de militares já trabalhando, mas ainda em formação. O Adj Cmdo atua buscando desenvolver neles o espírito militar.

No que tange à família militar, o Adj Cmdo é peça fundamental nas ações ligadas ao Plano de Assistência Social do Departamento-Geral do Pessoal. Quando inserido nos programas específicos, irá contribuir imensamente na identificação oportuna e judiciosa de demandas sociais. Remetendo-me ao Guia do Adjunto de Comando, há dias em que o mesmo é psicólogo, padre ou pastor e, até mesmo, pai!

Na gestão de pessoal, muitos eram os casos em que o adjunto de comando identificava militares desmotivados, fosse por capacidades individuais não aproveitadas, problemas pessoais, relacionamento interpessoal ou simples desejo de mudança (vontade de algo novo). E, então, sugeria mudanças, visando colocar “o homem certo no lugar certo”.

O militar não está rendendo bem? Onde ele poderá dar sua contribuição máxima? Possibilita-se, assim, que cada militar encontre o seu propósito no grupo, gerando “orgulho em pertencer”, um sentimento de utilidade fundamental para o bem-estar da tropa e, consequentemente, para o cumprimento da missão.

Você quer resultado? Não foque na meta, seja vetor do desenvolvimento pessoal e profissional de cada um, coloque as pessoas em primeiro lugar, construa uma visão comum a ser compartilhada e inclua o Adj Cmdo na difusão desta visão.

Por fim, cabe destacar que a aceitação e o reconhecimento de mérito em todos os níveis hierárquicos, incluindo o segmento feminino, são fatores determinantes para o desempenho da função. A nomeação de militar da OM favoreceu este aspecto no caso do 4º D Sup: a tropa já o conhecia e havia uma confiança previamente estabelecida.

Tendo esta base de confiança, atuou sempre como um fiel escudeiro (de todos), assessorando o comando com lealdade, proatividade e foco na solução!

 “E o escudeiro lhe disse: Faz tudo o que está no teu coração; volve-te, eis que estou contigo de acordo com o teu coração” (1 Samuel 14:7)

 

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Carreira Militar

Comentarios

Comentarios

Parabéns pelo texto. Objetivo.

És um líder!! Eterno Cmt! Farol! Minha continência e respeito 🫡🇧🇷 

As notas de fim não foram inseridas. Então, menciono aqui o que dizia uma delas: trabalhei com excelentes técnicos temporários, muitos com grande capacidade de liderança. A menção aos técnicos temporários do artigo merece essa observação, de maneira a não cometer injustiças.

Concordo em gênero, número e gráu com todo o teor do texto. Ainda acrescento que o Adjunto de Comando é um militar experiente, profissional tarimbado e tem conhecimento de causa, dado a sua expertise adquirida através de anos de caserna, podendo ser muito assertivo em suas percepções, ajudando, desta forma, o Cmt a tomar a melhor decisão em dado problema.

Excelente ilustração da função do Adjunto de Comando, que ainda é incompreendida por alguns mas que, quando bem executada, ajuda a melhorar a produtividade de uma Organização Militar nos campos humano, administrativo e operacional.

Importante visão de um Cmt que vivenciou dois momentos distintos, um ano com e outro sem Adj Cmdo. E fica claro, no texto, que o objetivo da função é justamente contribuir com o Comando, levando a intenção do Cmt à tropa e, ao mesmo tempo, trazer um assessoramento fiel e leal, proporcionando um ambiente de trabalho salutar e coeso.

Parabéns pelo artigo. Ficou muito bom e explicativo! Ele chamou a atenção pela visão do Comandante da importância do Adjunto de Comando para eficácia da missão da OM. 

Excelente, parabéns Cmt, observações que ajudam no entendimento da função de Adj de Cmdo.

Texto excelente! Retrata a visão de comandante face a função de Adj Cmdo. Não sendo este um mero catador de pontos, mas sim um militar pronto a assessorar o Cmdo e prestar apoio às praças da OM.

Texto muito bem escrito, sem floreios, direto ao ponto. Transcreveu a essência do cargo com precisão cirúrgica. Percepção inequivoca de quem, empiricamente, experimentou e soube empregar essa ferramenta ímpar, sem precedentes na história do Exército Brasileiro. 

Sábias palavras. Acrescentaria que sábio é o Cmt que sabe utilizar esta ferramenta (Adj Cmd) com eficiência, pois ela é fundamental para aumentar o poder de combate da OM, seja qual for a atividade fim. Basta deixar o militar trabalhar. Feliz em ler um texto que ressalta a importância do Adj Cmdo. Parabéns pela iniciativa Cmt. Att, Um ex-Adj Cmdo

Parabéns pelas sabias palavras.

O Sr. Resumiu com excepcional maestria a função de Adj de Cmdo, poucos tem essa percepção sobre o cargo.

Fui Adj Cmdo de uma OM logística, meus Cmt me davam liberdade para atuar e era exatamente essa função silente que fazia. Muitos não percebem a importância, porque não vêm os problemas que foram evitados na raiz.

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