A importância do relacionamento entre os PEF e as Comunidades Indígenas para o levantamento de dados, visando a Consciência Situacional na região da Cabeça do Cachorro

Autores: Maj Jefferson Andrade Lima da Silva
Quarta, 12 Novembro 2025
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A 2ª Brigada de Infantaria de Selva (2ª Bda Inf Sl), localizada no extremo Noroeste da Amazônia Brasileira, possui grande relevância para a missão do Exército Brasileiro. A região conhecida como “Cabeça do Cachorro”, estende-se da fronteira com a Colômbia, à Oeste, até o município de Barcelos (AM), no Leste, abrangendo praticamente toda a extensão, em território nacional, do Rio Negro, um dos principais afluentes do Rio Amazonas.

A “Brigada Araribóia” cumpre inúmeras atribuições, tendo como foco as vocações estratégicas do Comando Militar da Amazônia, que englobam: a Defesa da Pátria; o combate aos crimes transfronteiriços; a proteção ambiental; o respeito e apoio aos povos originários e à população amazônida; e a cooperação com o desenvolvimento regional.

Nesse ínterim, a existência de sete Pelotões Especiais de Fronteira (PEF), subordinados ao Comando de Fronteira Rio Negro/5º Batalhão de Infantaria de Selva, Organização Militar orgânica da Brigada, conforma o elo fundamental para a consecução dessas vocações, face ao espraiamento e à permanência constante de suas tropas, debruçadas na faixa fronteiriça do País com a Colômbia e com a Venezuela.

Particularmente, os PEF se mostram como ferramenta ímpar na consecução integrada de três dessas vocações estratégicas, quais sejam: Defesa da Pátria, combate aos crimes transfronteiriços e respeito e apoio aos povos originários. Essa integração advém, principalmente, da capacidade dos PEF de levantar dados de inteligência que auxiliam, direta e indiretamente, ao Comando da Brigada, no planejamento e execução de Operações que garantem a soberania nacional e o enfrentamento direto ao narcotráfico internacional, conforme será apresentado a partir deste momento.

A consciência situacional é peça-chave para um comandante, e essa se desenvolve a partir da interpretação e avaliação de informações relevantes, que permitem compreender de maneira mais assertiva um determinado cenário, direcionando para as decisões a serem tomadas (BRASIL, 2015). Nesse contexto, os militares que integram um PEF possuem as melhores condições possíveis para se tornarem a fonte primária de dados de grande valia para a decisão dos comandantes em todos os níveis.

Os PEF possuem, por suas características físicas e estruturais, um forte estreitamento com as Comunidades Indígenas (CI) que os cercam. Seguindo o lema da “Vida, Combate e Trabalho”, os PEF garantem um convívio constante e contumaz com os habitantes locais, por diversas situações, como compartilhamento de energia às comunidades, por intermédio de sua estrutura, trocas comerciais de itens produzidos pela comunidade, atendimento médico dos habitantes locais nas suas instalações, apoio com guias locais para a realização de reconhecimentos, além da participação das comunidades locais no próprio efetivo dos Pelotões, face à grande presença de indígenas nos contingentes da Força na região da Cabeça do Cachorro.

Assim, o bom relacionamento do PEF com as CI que os cercam, garante muitas benesses aos amazônidas, provendo o apoio direto às CI e fazendo o papel do Estado Brasileiro na integração dos povos originários à nossa nação. Em contrapartida, essa relação traz consigo a confiança das CI no trabalho do Exército Brasileiro, que representa a segurança para essas comunidades, que são o foco de ação de elementos ligados ao crime organizado e ao narcotráfico internacional.

A vulnerabilidade social que envolve a população amazônida e os povos originários é uma característica regional. A baixa presença de estruturas do Estado, o afastamento geográfico dos grandes centros e a falta de infraestrutura de transporte fazem da região da Cabeça do Cachorro um chamariz para elementos ligados às atividades ilícitas, criando grandes rotas para os crimes transfronteiriços, os quais acabam por envolver diretamente os habitantes locais, face à fragilidade econômica da região. Assim, a cooptação da população local e a sua imersão no consumo de drogas ilícitas é cada vez maior, principalmente entre os mais jovens, causando uma ruptura social que não é coadunada pelas pessoas mais experientes das comunidades.

Nesse sentido, a presença militar, por intermédio dos PEF, acaba sendo tratada como a principal estância de defesa para os indígenas que, por sua vez, cooperam diretamente com a transmissão de dados que, além de garantirem a sua autopreservação, servem de base para a ampliação da consciência situacional da 2ª Bda Inf Sl, no tocante à movimentação e o “modus operandi” de elementos que atuam ilegalmente na região.

Ademais, o próprio Exército Brasileiro entende que “todo militar desempenha um papel fundamental no campo de batalha quando se trata de consciência situacional. A tropa tem a oportunidade de coletar e relatar dados dentro da A Op, tornando-se, assim, um elemento crítico da capacidade de sua fração em alcançar a compreensão situacional do ambiente operacional” (BRASIL, 2021). Logo, cada elemento no terreno, o que inclui aqueles lotados nos PEF, deve atuar sempre de forma a compreender melhor o ambiente em que atua, levantando os dados que forem necessários para tal.

O mesmo caderno aponta também que “é importante que os comandantes e os soldados tenham uma compreensão refinada da população local. Compreender as considerações civis [...] pode contribuir para a obtenção do apoio da população” (BRASIL, 2021). Além disso, é notório que a percepção dos líderes de uma comunidade tem o potencial de validar, contestar ou até suavizar tanto as análises realizadas pelos escalões superiores quanto os dados obtidos pelas frações mais elementares (BRASIL, 2021). Observa-se, assim, que esses dois aspectos refletem diretamente na importância do conhecimento das comunidades indígenas quanto ao ambiente que os cerca, seja na dimensão física, humana ou informacional.

Sendo os habitantes originários da região, as Comunidades Indígenas conhecem com naturalidade o terreno e seus ocupantes, sendo os mais aptos a observar qualquer movimentação estranha ou mesmo a ação direta de elementos com intenções hostis no meio de sua população. Diferentemente dos PEF, que possuem uma única estrutura física de monitoramento das calhas dos rios amazônicos, os indígenas se estendem por todos esses movimentos, tomando nota com naturalidade de situações anômalas, em posições em que a presença de militares destoaria completamente do terreno. Logo, a aproximação entre os nossos soldados e os indígenas faz com que o conhecimento obtido pelas comunidades possa facilmente ser aproveitado por nossas tropas e informadas ao escalão superior para a correta análise dos dados.

Além disso, com a expansão da tecnologia atual, faz-se cada vez mais presente no entorno do Rio Negro e demais vias fluviais da Cabeça do Cachorro, meios de internet satelital de baixa altura, tal como o modelo da Starlink, que garantem fluidez e agilidade no trâmite de dados, por mais remota que a localidade pareça estar. Assim, essas informações podem ser passadas de imediato, por parte das comunidades que tem acesso a esse meio e, dessa forma, sequer a distância física pode ser considerada um empecilho que limite essa troca de informações, que acaba sendo benéfica para ambos os lados.

Em síntese, é possível afirmar que a perspicácia em aproveitar o conhecimento e preservar o bom relacionamento com as comunidades indígenas é tópico diferencial e decisivo para um Comandante de Pelotão de Fronteira que queira cumprir sua missão com maestria. A atividade de inteligência, que permeia todos os integrantes da Força, deve sempre ser encarada como uma prioridade por nossas tropas, de forma a garantir os subsídios necessários ao Comando, para que este possa tomar sempre decisões eficazes, o que no caso da 2ª Bda Inf Sl, acabam por impactar diretamente na segurança dos povos originários e no sucesso em sua missão de combater os crimes transfronteiriços na região da Cabeça do Cachorro.

Por fim, verifica-se que o relacionamento dos PEF com as Comunidades Indígenas é, antes de tudo, natural e espontâneo, pois cerca-se de benefícios para ambos os lados. Não surge como uma relação de interesses, mas sim como uma possibilidade contínua do aprimoramento de um vínculo que perdura por séculos, em um ambiente cercado de limitações, mas também de oportunidades.

 

Referências

- BRASIL, Estado-Maior do Exército, Manual de Fundamentos Inteligência Militar Terrestre, 2ª edição, 2015.

- BRASIL, Comando de Operações Terrestres, Caderno de Instrução Táticas, Técnicas e Procedimentos da Tropa como Sensor de Inteligência, 1ª edição, 2021.

CATEGORIAS:
Geral Defesa
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Comentarios

Excelente análise sobre a Consciência Situacional! Fica clara a importância da integração dos PEF e das Comunidades Indígenas como fonte primária e decisiva de dados. Parabéns pela abordagem estratégica e muito relevante para a segurança da região da Cabeça do Cachorro. Selva!

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