A defesa do litoral brasileiro: uma necessidade para o século XXI

Autor: Cel Maurício José Lopes de Oliveira

Sexta, 19 Novembro 2021
Compartilhar

O litoral brasileiro possui cerca de 7.300 km de extensão. Esse extenso litoral, aliado à posição geográfica, confere ao País um importante destaque geopolítico e estratégico. O Oceano Atlântico, que banha todo o litoral brasileiro, possui imensa biodiversidade marinha, grande capacidade econômica gerada pela pesca e pelo turismo, além da riqueza produzida pelas camadas do pré-sal existentes na plataforma continental, ocupando uma faixa de aproximadamente 800 quilômetros de comprimento ao longo do litoral brasileiro. Cabe destacar que as principais capitais brasileiras encontram-se a 200 km da faixa litorânea brasileira, e que 95% das exportações brasileiras em peso e 70% em valor são realizadas pelo mar.

A foz do Rio Amazonas, por sua vez, também possui  importância geoestratégica na porção norte do País, dispondo de abundantes recursos naturais, como ouro, manganês e minério de ferro. Além disso, conta com uma posição geográfica privilegiada em relação ao norte da América do Sul e ao Caribe por fazer fronteira com o Suriname e a Guiana Francesa, que é um território ultramarino da França (país participante da Organização do Tratado do Atlântico Norte)

O mar brasileiro guarda imensas reservas de petróleo e gás, além de  recursos não vivos (sal, cascalhos, areias e sulfetos, dentre outros), que representam importantes fontes de riqueza para o País. Ele também dispõe de uma grande variedade de organismos marinhos de valor biotecnológico que possuem propriedades com amplas aplicações, principalmente nas áreas de fármacos, cosméticos, alimentos e agricultura.

Nesse contexto, a Marinha do Brasil denomina essa importante área “Amazônia Azul”, expressão usada para ressaltar a importância estratégica e econômica dessa parte do território brasileiro que é tão vulnerável, em termos ambiental e estratégico, quanto à Amazônia continental verde.

Para fins de conceituação, a defesa do litoral é um conjunto de ações marítimas, terrestres e aéreas que visam impedir o inimigo de utilizar a área marítima adjacente ao litoral ou de projetar seu poder sobre a terra, garantindo a integridade da faixa terrestre contígua ao mar. Dessa forma, considera-se a importância de se promover uma discussão doutrinária sobre a defesa do litoral brasileiro a ser realizada de forma conjunta pelas três Forças Singulares: um poder naval forte com capacidade de patrulhamento marítimo da Amazônia Azul e de nossas hidrovias, a atuação da Força Aérea e uma eficiente e eficaz capacidade da Força Terrestre de rechaçar um desembarque anfíbio irão gerar uma grande capacidade de dissuasão extrarregional.

Ciente dessa necessária discussão, a Escola de Artilharia de Costa e Antiaérea (EsACosAAe) vem estudando o tema com atenção, por meio da sua Divisão de Doutrina e Pesquisa, e desenvolvendo o manual “A Força Terrestre nas Operações de Defesa do Litoral”. Planeja, também, a realização de um seminário sobre o assunto envolvendo militares do Ministério da Defesa e das três Forças Singulares da área combatente e da Ciência e Tecnologia, além de algumas empresas representantes de indústrias de defesa. A intenção do seminário será proporcionar uma oportunidade para a discussão do tema e para a troca de experiência de estudos já realizados, e em andamento, sobre o assunto no âmbito das Forças Armadas brasileiras, além da geração de conhecimentos que possam ser inseridos no manual mencionado.

Nesse contexto, algumas ideias poderão frutificar futuramente e ser adotadas pelo Ministério da Defesa: a criação de um Programa Estratégico que abranja o tema defesa do litoral; o fortalecimento da produção de mísseis antinavios já existentes e suas adaptações em diversas plataformas de lançamento; a criação de um Comando Operacional Conjunto de defesa do litoral, de caráter permanente, a ser liderado pela Marinha do Brasil, tendo em vista que o País já possui o Comando de Operações Aeroespaciais (COMAE); e o desenvolvimento de uma doutrina de emprego do submarino nuclear na defesa do litoral brasileiro.

Por fim, ressalta-se que o tema é de extrema relevância, pois, além de todos os  aspectos já apresentados no início deste artigo, há outros como a comprovada  realização de pesca ilegal no litoral argentino, a tentativa de construção de bases navais no Atlântico por parte da China e a presença norte-americana e britânica na região.  Portanto, a intensificação de exercícios militares conjuntos poderá contribuir para caracterizar as capacidades de prontidão, de dissuasão e de presença de nossas Forças Armadas para a defesa do litoral brasileiro.

Comentarios

Comentarios
Novamente, o TC Maurício José demonstra o seu grande potencial de análise, ora em assuntos pontuais e os mais amplos. A visão das operações conjuntas na defesa dos interesses nacionais se torna cada vez mais necessária, tanto pela economia de recursos, quanto de meios operativos para maior efetividade na projeção de Poder.
O tema é interessante, mas acho que a artilharia de costa é incompatível com a situação costeira do Brasil. Salvo engano, desde a década de 1950 os EUA já perceberam isso. Litorais extensos como o nosso, sem defrontação com outros países, são incompatíveis com a artilharia de costa. Ao contrário, países com litorais que se defrontam com outros países, em mares fechados, há necessidade de artilharia de costa. Vide países lindeiros ao mar Báltico e Negro.
A estratégia para a defesa de litoral está calcada na integração entre Mahan, Seversky e Makinder. A foz do Amazonas, mista entre estuário e delta, exige abordagem conjunta considerando a análise de seus fatores operacionais. Dos cerca de 7000 Km da linha e talvegue do Rio Mar, só o Brasil detém área de influência sobre o portão Atlântico. A sugestão apresentada pelo autor de um C Op Cj de defesa do litoral é interessante. No nível tático, atualmente, a 22a Bda Inf Sl, Brigada da Foz, talvez seja a mais estratégica GU do EB. Seu conjunto DOAMEPAII/FAMES é o de uma Bda de Selva com meios Anf e Flu. O núcleo do 5o BAvEx em Belém compartilha instalações da Base Aérea da FAB na guarnição paraense. Se considerarmos que a nível político e estratégico, Manaus "cairia pela manobra" uma vez Belém e/ou Macapá alvos (s) de uma Op Dsbq Anf, pode-se afirmar que, estrategicamente, o "Himland Amazônico" (Belém) é politicamente mais importante que o "Heartland" do Complexo Regional (Manaus). Tais aspectos ficaram evidentes nos trabalhos da FTC TERÇADO em 2014, do 1o tiro amazônico do Sistema ASTROS 2020 na região da RPP de Goiabal, única RPP Amazônica e Atlântica, e do 2o tiro amazônico do ASTROS na Operação Amazônia 2020. Neste contexto, e ainda considerando as ameaças estatais a NW e NE do Complexo Regional Amazônico, é mister que as Op Cj definitivamente se voltem para o peculiar desafio de, à luz dos fatores operacionais da Rg Foz do Lar das Yncaminhabas, atualizar o PEECFA da defesa da foz e de sua área de influência (Experimentação de Defesa de Litoral EB70-MC-10.253, Fundamentos Conceito Operacional do EB – Operações de Convergência 2040 e EB70-N-12.001_Normas_de_funcionamento_do_SISEMP_31.01) especialmente com os ensinamentos do Mar Negro e da bacia do Rio Dnipro (Rùssia x Ucrânia em Ambi Rib e Anf).

Navegação de Categorias

Artigos Relacionados