22ª Brigada de Infantaria de Selva: a Brigada da Foz do Amazonas

Autor: Coronel R1 José Arnon dos Santos Guerra

Sexta, 24 Maio 2024
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Em 12 de janeiro de 1616, a cidade de Santa Maria de Belém do Grão Pará foi fundada. As intenções portuguesas que residiam naquele sítio eram as mais diversas e defender a foz do rio Amazonas a mais importante. Um século e meio depois, os portugueses entenderam que a foz se situava na margem norte do grande rio e ali, então, fixaram o Forte São José de Macapá.
A partir dessa iniciativa, o estado do Amapá transformou-se e se desenvolveu ao longo da história do Brasil, inclusive em relação à Defesa, chegando ao século XX sem significativas alterações na configuração das forças militares ali desdobradas. Até o início do século XXI, o estado tinha apenas uma unidade de Infantaria de Selva, o Comando de Fronteira Amapá/34º Batalhão de Infantaria de Selva, com apenas duas companhias em Macapá e uma terceira destacada em Clevelândia do Norte, a antiga Colônia Militar do Oiapoque (1919).
No dia 13 de junho de 2013, com a criação do Comando Militar do Norte (CMN), o cenário militar passou a evoluir com a intenção de se instalar na capital a sede de uma grande unidade da Força Terrestre. Em dezembro, esse propósito começou a se tornar uma realidade e o projeto de tirá-la do papel teve seu primeiro passo com um reconhecimento, em 18 e 19 de dezembro.


 

Nenhum projeto dessa magnitude é simples, ainda mais quando se trata da Amazônia e da transposição de uma via fluvial do porte do Amazonas. Os custos aumentam, as dificuldades logísticas se multiplicam, os meios  escasseiam e as pessoas precisam se manter motivadas o tempo todo. O Comandante Militar do Norte manteve a missão e o prazo:
- Dia 31 de julho de 2014, vamos lançar a Pedra Fundamental da Brigada da Foz.
Comparando-se com as demais Brigadas que se instalaram na Amazônia, o tempo parecia exíguo para cumprir a missão, e foi. O trabalho no Comando Militar de Área era intenso, havia muito a se fazer todos os dias: a rotina de um QG de General de Exército; coordenação das instruções e das operações; as tarefas de um novo comando de área em implantação; etc. Contudo, o planejamento metódico, balizado por marcos, etapas, objetivos claros, diretrizes simples e liderança estratégica, facilitou a manobra. O tempo avançava, os problemas apareciam e as soluções surgiam uma a uma, numa cadência sincronizada.
Nos intervalos de rajada, como se diz entre os espíritos aguerridos, o Comandante (Cmt) transitava por Brasília e Macapá, buscando os apoios necessários para a consecução do projeto. Quando estava no terreno, fiscalizava todos os detalhes, principalmente os de Engenharia, onde o eficiente apoio da Comissão Regional de Obras/8 foi um dos fatores de sucesso da empreitada. Em todas as portas em que batia, o Comandante era bem recebido e até com um certo semblante de surpresa das autoridades: “Por que não fizemos isso antes?”.


 

Quando se tem um prazo a cumprir, o gargalo da ampulheta aumenta de tamanho conforme a complexidade da tarefa, o tempo avança muito rápido. Julho se aproximava e os trabalhos se avolumavam, sempre com nuances de ineditismo, afinal, o CMN também era recém-criado, o que era uma novidade para todos os militares do QG. Acrescentem-se às imensas dimensões e desafios oferecidos pela área que compreende os estados do Pará, Maranhão e Amapá (o Bico do Papagaio, região norte do Tocantins, foi incorporado ao CMN em 2015) e se notará que as exigências sobre o EM se exponenciavam no primeiro semestre de 2014.
O projeto foi conduzido com observação rigorosa do arcabouço legal vigente e o processo licitatório foi concluído em 25 de junho de 2014. Respeitou-se o período legal para sua homologação, enquanto a Pedra Fundamental era procurada no município de Pedra Branca do Amapari, 200 Km a noroeste da capital. Em 25 de julho, uma semana antes da data estipulada; a missão foi dada como cumprida para o Gen Ferreira. Este, por sua vez, informou ao Comandante do Exército e a sua decisão foi realizar o lançamento no mês seguinte, durante as comemorações da Semana do Soldado.


 

Fig 3: dia 28 de agosto de 2014, a Pedra Fundamental da Brigada da Foz foi oficialmente lançada. Ao centro, Gen Ferreira e Gen Div Madeira, Cmt 8ª RM; à direita, autoridades de Macapá e o Gen Bda César, Ch EM CMN; à esquerda, o Major Brigadeiro Borba Cmt 8º COMAR; e o Cel Guerra Ch CCOp CMN.


Esse momento revestiu-se de grande importância para todos os amapaenses, por criar oportunidades como geração de emprego e renda; aumento da segurança; desenvolvimento social e tecnológico; entre outros. A prova disso é a comparação do antes e depois de Marabá (PA), São Gabriel da Cachoeira e Tefé, no Amazonas, Boa Vista (RR) e Porto Velho (RO). Gerações de militares nessas localidades, assim como seus habitantes, são testemunhas dos valores que uma Grande Unidade da Força Terrestre leva para os locais onde moram.
Após o lançamento, as obras iniciaram de imediato, posto que o objetivo subsequente era inaugurar a sede da Brigada, sem muita pressa e sem tanto atraso, o que aconteceu em 26 de janeiro de 2018, com a instalações prontas e a assunção do seu primeiro comandante no Posto de Comando, o General de Brigada Luiz Gonzaga Viana Filho. Esse fato concluiu um caso de sucesso e exemplo de sinergia para a consecução de um projeto militar.


 

Fig 4: Em 28 de agosto de 2014, tão logo se encerrou a cerimônia, os operários iniciaram os trabalhos de construção dos pavilhões da Brigada e dos PNR de oficiais e sargentos.


Em resumo, a atual 22ª Brigada de Infantaria de Selva é sucedânea do reduto do Macapá (1738) e concretizou com modernidade a percepção do Exército da importância estratégica da Amazônia Oriental. Para os pioneiros do CMN, e muito provavelmente para grande parte dos amapaenses, essa Grande Unidade continuará a ser carinhosamente chamada de Brigada da Foz, hoje um repositório de esperanças e nostalgias dos que viveram aquele momento ímpar da nossa história militar, registrado, entre outras, por essas palavras:


O monólito à frente, marcado pelo depósito basáltico de milhões de anos, guarda traços das incalculáveis riquezas do estado do Amapá. Essas riquezas, capazes de transformar a nossa sociedade, não serão mais guardadas apenas por novas camadas minerais, antes, o serão pela vontade desta e das futuras gerações de brasileiros.
Este ato simbólico evidencia a vocação da Brigada da Foz que, ao implantar-se no estuário do Amazonas, traz os ventos do futuro e nos ensina a promover iniciativas do Estado que valorizam os recursos públicos, os quais a sociedade, silente, atenta e esperançosa, coloca à disposição do Exército Brasileiro.
Registre-se, ainda, que esta Grande Unidade da Força Terrestre fortalece o interesse nacional por esta região estratégica, com respeito à sustentabilidade ambiental, além de proteger para o Brasil este opulento solo que a natureza deu sem nada pedir em troca.

Comentarios

Comentarios

Muito na marca!

Parabéns, coronel!

Faz-se necessário proteger nossa Amazônia.

Parabéns pelo excelente texto. A clareza e precisão são impressionantes, refletindo seu profundo conhecimento e dedicação.

Trazer ao debate a nossa Amazônia sempre será importante.  Durante o período colonial diversos povos europeus tentaram dominar a bacia do Amazonas.  Ingleses, espanhóis,  franceses e holandeses, dentre outros, tentaram firmar posse na região,  só sendo derrotados pela astúcia e perseverança da união de povos amazônicos e portugueses contra os invasores. A criação desta Brigada enfatiza a importante preocupação com uma das regiões mais ricas do mundo, com trilhões de dólares em potencial exploração de recursos minerais, biológicas e agropecuária.  Este conflito está em curso, não na fase da presença militar, mas sim no questionamento da legitimidade da soberania nacional. Operacionalizar a maior presença na foz da maior bacia fluvial do mundo não desanimará a cobiça internacional,  mas demonstrará que a  Nação brasileira estará disposta a pagar caro por qualquer afronta.

Parabéns pelo artigo tão bem escrito.

Boa tarde, sou SGT Tavares ex: comandante da guarda municipal de altinho , Pernambuco 

Tiver a honra de receber a das viaturas a chave da guarda municipal de altinho 

Mês de junho de 2020 dessa figura ilustre Sr. Cel Guerra foi momento histórico ficou maco registrado por resto da vida. 

 

Exército Brasileiro, instituição que não dorme e não dormita braço forte 💪 mão amiga. Fica a minhá 🫡.

Excelente texto!

História muito rica para a cultura militar e civil de todos, principalmente os amazonenses. Não é atoa que dizem que no Amapá é onde se inicia o Brasil.

O Brasil é um gigante pela própria natureza, mas graças a guerreiros com o Ilustre Coronel Guerra a segurança pública e suas complexidades se torna um elo entre o cidadão e os diversos poderes que administram , organizam e protegem nosso povo. E com apoio do braço forte e da mão amiga do nosso Exército Brasileiro, a vitória é certa na luta pela paz social.

Excelente histórico da importância do mapeamento da áreas carentes de ação do Estado e o olhar estratégico do EB na  fixação de infraestrutura militar para o desenvolvimento local e o progresso sustentável das comunidades amazônicas. Obrigado por resgatar mais esse trecho auspicioso de nosso braço forte e mão amiga! 

Parabéns pelo artigo, amigo Guerra! Mais um exemplo de como o estratégico e operacional podem andar juntos no progresso das comunidades amazônicas. Seria interessante enfatizar a ação do EB no socorro das vítimas da seca do Amazonas e enchentes no RS! 

O Amapá é tão importante quanto o meu estado, o Rio Grande do Sul, o brado das tropas dali revela essa verdade: "Aqui começa o Brasil!".

Durante muito tempo isso foi uma realidade, embora o Brasil, ao Norte, comece de fato no Monte Caburaí, onde a comunidade indígena Manalai, dos índios Ingarikós, é o primeiro povoamento nacional para quem viaja na direção Norte-Sul dos meridianos.

Visitei o Oiapoque e descobri um País que não conhecia, lindo, preservado, rico e seguro, onde grande parte dessa segurança provém das forças que ali estão e que, em 2018, foram adensadas pela iniciativa aqui bem descrita, a Brigada da Foz. Na minha opinião, quanto mais Exército, melhor, porque, em muitos lugares da Amazônia, é a única presença do Estado para acolher os cidadãos.

Excelente registro da história da 22ª Brigada de Infantaria de Selva. Se ninguém registrar, cai no esquecimento o trabalho realizado por aqueles que foram os percursores.da Brigada da Foz.  Parabéns Cel Guerra.

Esta empreitada está repleta de participação dos militares da turma de 1987 da AMAN. Desde a participação dos jovens oficiais que passaram pelos pelotões, subunidades e unidades, até o primeiro comandante da brigada recém instituída. Que este artigo (cujo autor é integrante desta turma) sirva como mais um fator de união da turma e do EB, como um todo, neste momento difícil pelo qual passamos

Sensacional feito.

Parabéns, Cel Guerra!

CEL Guerra, tive a honra de ser seu subordinado por 2 anos no CFronRR/7° BIS, Batalhão Forte São Joaquim..mesmo depois de um tempo, o Sr ainda deixa lembranças nas mentes daqueles que ombrearam ao seu lado. Tem o meu respeito e admiração 

Realmente um belíssimo trabalho. É bom que os militares do exército tenham conhecimento da história da sua força. Um trabalho como este será para a eternidade, um a composição da história 

A 22ª Bda Inf Mtz é a mais nova grande unidade do E.B. e o breve resgate histórico confirma a impiortância da defesa da Foz do Amazonas. Artigo muito oportuno.

Texto  muito oportuno, tendo em vista ter sido publicado justamente no dia da Infantaria. O Cel Guerra nos brinda com este ensaio histórico que nos coloca diretamente no contexto da implantação da 22° Bda Inf Mtz - Brigada da Foz - com todas as suas dificuldades e demais óbices. Parabéns ao CMN pela iniciativa e para todos os militares que participaram dessa epopeia!

Avante Sempre Exército Brasileiro!

Parabéns coronel guerra por esse trabalho excelente texto

Boa tarde. O texto informa que a localização da Brigada da Foz é no 'estuário' do Rio Amazonas...

Contudo, de acordo com a Geografia, o tipo de foz do Magestoso rio é do tipo 'delta', ou misto.

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