Uma nova disciplina para a Defesa: o papel da Engenharia de Sistemas e da Gestão Híbrida em projetos de PD&I na área da Defesa

Autores: General de Divisão TALES EDUARDO ARECO VILLELA Cap Irony
Quarta, 25 Junho 2025
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Os projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) para a área da Defesa necessitam de ferramentas e técnicas robustas de gestão. Tais projetos possuem características específicas como:

  1. O tempo e o custo da solução são de importância secundária: o desenvolvimento de soluções tecnológicas para a Defesa é mais focado na eficácia e na capacidade operacional do que em escalas de tempo e orçamento (KUCHTA; SKOWRON, 2016).

  2. Os objetivos são ambíguos: isto é, especialmente comum em projetos grandes que surgem de requisitos gerais e ao longo do tempo devem ser definidos de forma mais restritiva (KUCHTA; SKOWRON, 2016; FERNANDES et al, 2018).

  3. Os requisitos são voláteis: tecnologias em constante evolução e ameaças imprevisíveis exigem adaptação constante (ALAM; TOPPUR, 2019; FERNANDES et al, 2018; HUCHZERMEIER; LOCH, 2001).

  4. Os financiamentos são públicos e devem obedecer aos procedimentos formais (KUCHTA; SKOWRON, 2016), como:

    1. Um modelo reconhecido em etapas que ajuda a manter uma abordagem disciplinada e controlada durante as fases de desenvolvimento.

    2. Um processo de tomada de decisão rigorosamente controlado, que exige avaliações rigorosas antes de entrar em uma nova fase.

    3. Métodos sistemáticos que estimulem, simultaneamente, a criatividade e o pragmatismo.

Essas características ressaltam a complexidade dos projetos de PD&I na área da Defesa e evidenciam a necessidade de uma gestão que integre rigor técnico com flexibilidade para lidar com mudanças e incertezas.

A Abordagem Híbrida para Gestão de Projetos

Com base nessas particularidades, deve-se superar a resistência ao planejamento de forma tradicional, que preconiza em detalhar inicialmente todas as etapas de um projeto (ALAM; TOPPUR, 2019; PMI, 2017). Uma técnica criada pelo General dos Estados Unidos Collin Powell orienta que a tomada de decisão deve ser feita quando se tem entre 40 e 70% das informações necessárias, pois esperar por 100% dos dados pode resultar em decisões tardias e oportunidades perdidas.

Dessa forma, conclui-se que uma abordagem de gestão híbrida, que reúne o tradicionalismo e a mentalidade ágil, possui maior correlação para lidar com os desafios inerentes aos projetos de PD&I na área da Defesa. Essa combinação permite equilibrar o rigor imposto pelos processos formais com a flexibilidade necessária para abordar as incertezas e o dinamismo típicos desses projetos.

A Engenharia de Sistemas possui mecanismos para gerenciar e integrar soluções complexas. Ela oferece uma perspectiva holística do projeto, cobrindo todas as fases do seu ciclo de vida e assegurando que os requisitos funcionais e técnicos sejam plenamente considerados (FREITAS; OLIVEIRA, 2008).

Métodos Ágeis, adicionalmente, privilegiam ciclos curtos de desenvolvimento, feedbacks contínuos e rápidas adaptações às mudanças (DIKERT et al, 2016). Essa abordagem iterativa possibilita que as equipes identifiquem e respondam com agilidade às mudanças conforme elas são identificadas durante as atividades do projeto. O que alivia os efeitos dos requisitos incertos e aumenta a qualidade das soluções finais.

A Figura 1 é um exemplo de uma integração entre a engenharia de sistemas e práticas ágeis. Cada equipe, seja de hardware, firmware ou software, possui sua particularidade no que diz respeito a prazos e custos. Tais particularidades influenciam na cadência para gerar incrementos físicos, bem como épicos de firmwares e softwares (INCOSE, 2023).

Figura 1: Ilustração que retrata os processos de iteração e de incremento assíncronos utilizando engenharia de sistemas em sinergia com as práticas ágeis. (Fonte: INCOSE, 2023)

A abordagem híbrida para a gestão de projetos de PD&I na área da Defesa traz ganhos significativos, como:

a) Fornece uma abordagem prática com a metodologia formal de Engenharia de Sistemas: que torna nossos engenheiros disciplinados e atentos em cada etapa do desenvolvimento, garantindo que o resultado final seja robusto e confiável.

b) Adaptabilidade: as metodologias ágeis permitem que as equipes respondam efetivamente as incertezas e se adaptem aos novos cenários e requisitos, à medida que o projeto se desenvolve.

Capacitação - a primeira etapa para alcançar o objetivo

Para que esse método integrado funcione de forma efetiva, é crucial que o Exército Brasileiro continue investindo na capacitação de seus recursos humanos. Devido à complexidade, aos desafios e à velocidade de mudança cada vez maior dos artefatos tecnológicos presentes nos campos de batalha, possuir profissionais especializados em gerir projetos tecnológicos do planejamento até a conclusão se torna não mais um mero requinte, mas, sim, uma necessidade pujante.

Por intermédio do treinamento e da capacitação de militares e civis, a equipe possuirá, além de um arcabouço teórico fundamentado nas melhores práticas internacionais de gestão de projetos, o conhecimento prático necessário para enfrentar os objetivos complexos e de natureza inovadora dos projetos de PD&I na área da Defesa. Essa preparação não apenas fortalece a capacidade técnica do Exército, mas também contribui para a disseminação do conhecimento científico e tecnológico no Brasil.

Influência no Exército e na Sociedade Brasileira

Com impactos positivos além do escopo do Exército Brasileiro, investir em Engenharia de Sistemas, Gestão de Projetos e em abordagens adaptativas também é uma estratégia poderosa. Essas abordagens estimulam a indústria nacional, fortalecem a soberania tecnológica e contribuem para o crescimento econômico e social do país, impulsionando a inovação e o avanço tecnológico.

O Exército Brasileiro gera conhecimento, qualifica mão de obra e amplia a Base Industrial de Defesa (BID) ao treinar profissionais e ao conduzir projetos de forma integrada. Formar uma estrutura que é capaz de resolver problemas tecnocientíficos futuros garantirá, não só a soberania nacional, mas, também, impulsionará o desenvolvimento do País. Assim, é imprescindível que o Exército Brasileiro continue aprimorando seus recursos humanos em Engenharia de Sistemas, Gestão de Projetos e métodos ágeis para fortalecer sua capacidade de inovação e de resposta aos desafios emergentes.

Referências

ALAM. M. P.; TOPPUR, B. Hybrid Agile Project Management Model for New Product Development in Aerospace. International Journal of Operations and Quantitative, v. 25, n. 1, p. 59-73, 2019.

DIKERT, K.; PAASIVAARA, M.; LASSENIUS, C. Challenges and success factors for large-scale agile transformations: A systematic literature review. The Journal of Systems and Software, 2016

FERNANDES, G.; MOREIRA, S.; ARAÚJO, M.; PINTO, E. B.; MACHADO, R. J. Project Management Practices for Collaborative University-Industry R&D: A Hybrid Approach. Procedia Computer Science, v. 138, p. 805-814, 2018.

FREITAS, J. E. F.; OLIVEIRA, L. G. The systems engineering and cops theory as management tools for information technology complex projects. Journal of Information Systems and Technology Management, v. 5, n. 1, p 15-36, 2008.

HUCHZERMEIER, A.; LOCH, C. H. Project Management Under Risk: Using the Real Options Approach to Evaluate Flexibility in R&D. Management Science, v. 47, n. 1, p. 85-101, 2001.

INCOSE, Systems Engineering Handbook: a guide for system life cycle processes and activities. 5th ed. San Diego: Wiley, 2023.

KUCHTA, D.; SKOWRON, D. Classification of R&D projects and selection of R&D project management concept. R&D Management, v. 46, n. 5, p. 831–841, 2016.

LINK, C. P.; SILVA, G.; BARICHELLO, R. MAGRO, C. B. D. Fatores Críticos no Gerenciamento de Projetos Públicos Sustentáveis. Revista de Gestão de Projetos, v. 11, n. 2, p 87-109, 2020.

PMI. Um guia do conhecimento em gerenciamento de projetos. Guia PMBOK, 6a. ed. – EUA: Project Management Institute, 2017.

CATEGORIAS:
Ciência e Tecnologia

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