TRÊS REGRAS PARA UM BOM PLANEJAMENTO DE ESTADO-MAIOR – O TRIPÉ DO SUCESSO MILITAR

Autores: Maj Cezar Augusto Rodrigues Lima Junior
Segunda, 30 Junho 2025
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Inúmeros estudiosos militares descrevem a condução da guerra como uma arte centrada na pessoa do líder militar, cujo fulcro é a vitória. Dessa forma, o estratego é o responsável por interpretar os objetivos políticos e, assim, conduzir os exércitos no campo de batalha. Mas, se ao General cabe o ônus da decisão, devido a sua experiência, capacidade e consciência do que acontece no seu entorno, existe uma classe de soldados, cuja função é preparar os planos de alto nível para apoiar essa decisão: o oficial de Estado-Maior.

Historicamente, grandes generais como Alexandre, educado por Aristóteles, decidiam muitas vezes de maneira pessoal, muito baseados no seu gênio e, às vezes, até influenciados por oráculos. A forma de decidir e conduzir a guerra se manteve mais ou menos monolítica por séculos, muito pelo fato de a própria humanidade não ter modificado, essencialmente, a maneira de guerrear, ainda amparada pela Revolução Agrícola.

Posteriormente, durante as Guerras Napoleônicas, o próprio gênio militar do general francês e as derrotas dos prussianos fizeram com que estes realizassem reformas que permitissem organizar e coordenar exércitos da Era Industrial de maneira profissional. Scharnhorst, Gneisenau e Clausewitz são lembrados como artífices dessa mudança.

Hoje, passados mais de dois séculos, o mundo ainda utiliza o Estado-Maior como organização essencial para preparar planos e ordens em apoio ao líder militar. Competência técnico-profissional, meritocracia (na seleção intelectual do pessoal) e uso de uma consagrada metodologia são características essenciais na execução do trabalho de Estado-Maior.

Mas se todos sabem e tentam seguir essa fórmula, por que alguns vencem e outros são derrotados? De fato, muitos imponderáveis influenciam o resultado das campanhas militares. Das decisões políticas à “névoa da guerra” e, até mesmo, a vontade de lutar de uma nação fazem com que a vitória muitas vezes não dependa apenas da capacidade dos planejadores, como é bem explorado na “Tríade Paradoxal” de Clausewitz.

Levando em consideração o exposto, o presente ensaio visa a apresentar três regras para apoiar um bom planejamento de Estado-Maior: orientar os trabalhos pelas ordens do escalão superior e a intenção do comandante; coerência interna na elaboração e execução do planejamento; e não menosprezar a doutrina. As três regras bem ajustadas podem encontrar o equilíbrio num chamado “Tripé do Sucesso Militar”, não pela certeza de levarem ao sucesso em si, mas por ampliarem as suas chances.

1. Orientar os trabalhos pelas ordens do escalão superior e a intenção do comandante.

O decisor, como explanado na introdução desse artigo, interpreta os objetivos políticos e os transforma em objetivos para os níveis Estratégico, Operacional e Tático. Para tanto, se vale de métodos e do próprio trabalho executado por seu Estado-Maior. Nele, traça também sua intenção e o estado final desejado. A Metodologia da Concepção Operativa do Exército é um exemplo de como a missão oriunda do escalão superior pode ser interpretada e assim os planejadores podem delinear “o quê fazer”, antes de iniciarem o “como fazer”.

Ora, eis que nessa fase do planejamento, o gênio, a consciência situacional e a sabedoria, baseados na larga experiência do estratego, ficam mais evidenciados. Assim, quando o Estado-Maior orienta o seu trabalho profissional metódico, se valendo dessa expertise, acrescenta o elemento da arte à ciência da guerra.

2. Coerência interna na elaboração e na execução do planejamento.

Durante a elaboração do planejamento, os integrantes do Estado-Maior devem compreender que de nada adianta o oficial de operações planejar uma manobra brilhante se ela está fora de compasso com a capacidade logística, a qual é de conhecimento do oficial de logística, ou mesmo não leva em consideração a situação do inimigo, de ciência do oficial de inteligência. Assim, o trabalho de Estado-Maior deve ser feito em grupo e saber trabalhar em grupo é uma competência fundamental de seus integrantes.

Ainda, uma vez feito o planejamento, durante a execução, a própria “névoa da guerra” pode gerar nos planejadores a “vontade” de modificar os planos. Não se trata de não poder modificar um planejamento, já que para isso existem as ordens fragmentárias e a própria conduta da guerra. Trata-se de acreditar que o trabalho anterior foi bem elaborado, pois foi orientado aos objetivos, à intenção do comandante, avaliados e mitigados os riscos e estudado o inimigo. Em síntese, foi feito um trabalho profissional que deve ser confiado.

3. Não menosprezar a doutrina.

Um bom planejamento militar deve levar em consideração a doutrina militar. Não se trata de copiar fielmente manobras desenhadas num manual ou executadas nos bancos escolares. Ambas são apenas exemplos e fundamentais no aprendizado. Trata-se de, compreendendo os conceitos doutrinários, analisar à luz da doutrina os princípios de guerra, fatores operacionais e os fatores da decisão.

Se o “terreno é o grande ditador”, de nada adianta um plano brilhante pautado na orografia da região se o inimigo tem a capacidade de realizar um envolvimento e conquistar objetivos profundos, fazendo as nossas tropas caírem pela manobra.

O Estado-Maior que se utiliza da doutrina e da matriz doutrinária do inimigo aumenta as suas chances de sucesso, pois compreende os conceitos que lhe permitem saber o momento de mudar uma atitude defensiva para ofensiva, realizar um contra-ataque, combinar armas para concentrar poder de combate atendendo ao princípio da massa entre tantas coisas.

A doutrina é uma compilação de lições aprendidas e, por mais que a guerra mude ou evolua, muito do que é executado no campo de batalha hoje, já foi realizado por generais de várias épocas como Cipião Africano, em Zama, quando derrotou os cartagineses de Aníbal num duplo envolvimento; Carlos Martel, que usou a surpresa e o terreno para derrotar os omíadas em Tours; ou mesmo Guderian, que combinou armas e boa coordenação para lhe garantir velocidade e surpresa; e tantos outros generais que conheciam e apreciavam a história militar. “Nem todas as ideias novas são tão novas assim”.

Assim, apresentadas as três regras para apoiar o bom planejamento de Estado-Maior, o “Tripé do Sucesso Militar”, espera-se que os oficiais planejadores não esqueçam que cabe ao líder a “arte da guerra”, mas ao oficial de Estado-Maior, este não pode jamais olvidar que é o profissional da “ciência da guerra” e assim, seguindo um método, equilibrar fatores externos e internos e preparar o caminho para uma boa decisão do chefe militar.

 

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Recursos Humanos

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