Mudança nas prioridades de defesa norte-americanas

Autores: Coronel R1 Paulo Roberto da Silva Gomes Filho
Segunda, 26 Março 2018
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No último dia 19 de janeiro, o Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América publicou uma sinopse da sua Estratégia de Defesa – o texto completo não foi disponibilizado por ser secreto. A versão tornou públicos os aspectos ostensivos daquela Estratégia e significa uma guinada nos rumos das Forças Armadas daquela superpotência, capaz de influenciar bastante as relações entre EUA, China e Rússia.

O documento é assinado por Jim Mattis, atual Secretário de Defesa. Mattis é General Fuzileiro Naval da reserva. Sua última função na ativa, como general de exército, o mais alto posto da carreira militar, foi a de Comandante do US Central Command, um dos seis Grandes Comandos Conjuntos dos Estados Unidos. No posto de tenente-coronel, em 1991, comandou um Batalhão na Guerra do Iraque. Como coronel, em 2001, liderou um Regimento de Fuzileiros na Guerra do Afeganistão e, promovido a general em 2003, comandou uma Divisão dos Marines na invasão do Iraque. Trata-se, portanto, de um Secretário de Defesa respeitado entre os profissionais militares, experiente e experimentado em combate.

A Estratégia reconhece, claramente, que a superioridade militar dos EUA sobre seus possíveis adversários está diminuindo. Isto confere ao texto um sentido de urgência na busca do restabelecimento de uma superioridade militar que volte a ser ampla e incontestável.

A edição marca nova visão norte-americana em relação à defesa. A chamada "Guerra ao terror" perde importância. A competição entre Estados Nacionais passa a ser (novamente, a exemplo dos tempos de Guerra Fria) a primeira preocupação dos EUA em relação à Segurança Nacional.

Os adversários nominalmente citados são China, Rússia, Coréia do Norte e Irã. O primeiro é acusado de militarizar o mar do Sul da China e de usar o poder econômico para intimidar vizinhos. Ao segundo, atribui-se violação de fronteiras e intimidação de países lindeiros. A Coréia do Norte é listada pela busca do desenvolvimento de tecnologia nuclear para fins militares e pelo programa de desenvolvimento de mísseis intercontinentais. Ao Irã é conferida a instabilidade do Oriente Médio, especialmente pela busca de uma hegemonia regional e pelo patrocínio de atividades terroristas.

Um ambiente internacional muito mais complexo, de mudanças tecnológicas e de crescentes desafios à segurança, exige, na visão apresentada pelo documento, forças armadas mais letais, resilientes e inovadoras. Determina, ainda, o fortalecimento das alianças e a atração de novos parceiros internacionais.

Além disso, de acordo com o documento, a construção de uma força armada preparada para vencer a guerra exige que se atribua alta prioridade para a sua preparação e o seu adestramento. Assim, cita-se a necessidade de uma suficiente e contínua dotação orçamentária. Da mesma forma, capacidades-chave devem ser modernizadas. As forças nucleares, o espaço e o ciberespaço, os sistemas de comando e controle e as comunicações, as defesas antimísseis, a inteligência artificial, a robótica e a logística, entre outras capacidades, são aspectos que devem merecer atenção e modernização.

É uma espécie de reencontro das forças armadas com a sua vocação primária. Após uma fase em que a guerra ao terror enfatizava técnicas, táticas e procedimentos adequados ao combate de contra-insurgência, completamente diferentes daqueles destinados ao combate convencional, retorna-se, agora, com toda ênfase ao clássico inimigo identificado como sendo um ente estatal. Isto certamente trará grandes e profundas consequências no preparo e no emprego das tropas norte-americanas. Apenas um exemplo dessas mudanças: forças sobre rodas e com blindagens leves deverão, gradativamente, ser substituídas por forças pesadas e de maior blindagem.

O documento também se dedica à formação dos recursos humanos das forças armadas. Afirma, com todas as letras, que a educação militar profissional está estagnada, mais preocupada com o cumprimento dos currículos previstos do que com a letalidade ou a engenhosidade. Reafirma a importância da iniciativa em combate e da capacidade dos líderes de decidirem por si mesmos e com grande iniciativa, na eventualidade cada vez mais provável de as comunicações serem afetadas pela guerra cibernética das potências inimigas.

No campo das relações internacionais, o documento enfatiza a importância de reforçar alianças e atrair novas parcerias. Destaca as regiões do Indo-Pacífico, da Europa e do Oriente Médio, sem deixar de citar a importância de um hemisfério ocidental estável. Chamam atenção, pelo claro desafio aos interesses chinês e russo, as diretrizes para se expandirem as alianças na região do Indo-Pacífico, sobretudo pelo estabelecimento de relações bilaterais e multilaterais de segurança com os países daquela região, e para se fortalecer a OTAN, com o objetivo de dissuadir ações russas e de controlar o arco de instabilidade na periferia da Europa.

A nova Estratégia de Defesa norte-americana deve ser estudada não só pelos interessados nos assuntos de defesa, mas também por todos os observadores da cena internacional. Ao anunciar claramente suas novas prioridades estratégicas, o documento marca a firme tomada de decisão da superpotência global pela manutenção do seu "status". Resta saber quais serão os movimentos das potências militares (re) emergentes que terão seus interesses político-estratégicos diretamente afetados, principalmente as mencionadas China e Rússia. As regiões do Mar do Sul da China e do Leste Europeu, além da Península Coreana e do Oriente Médio, devem ser as mais afetadas pelo novo posicionamento norte-americano.

Oxalá a nova realidade internacional exposta claramente na Estratégia de Defesa dos EUA desperte estudiosos e acadêmicos brasileiros para um maior interesse pelo estudo dos assuntos de defesa.

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Enquanto China, Rússia, Coreia do norte e Venezuela, para citar apenas estes, fazem suas manobras antidemocráticas para se eternizarem no poder, os EUA levam a fama de imperialistas, como se lá fosse uma ditadura perene. Incrivelmente aqui no Brasil pessoas sejam por falta de conhecimento de causa ou interesses escusos, se dispõe a tirar defunto da sepultura com notável ação tendenciosa contra os interesses e defesa de nossa Pátria. E o pior, em favor de genocidas comprovados. Essas pessoas não representam o Brasil e se assim o fazem, representam muito mal. Honestamente falando, eu não me assusto com mais nada nessa republiqueta outrora denominada de Brasil. Mas o jogo não acabou ainda e o nosso pendão verde, amarelo, branco e azul, dentro de pouquíssimo tempo, novamente tremulará soberano e para sempre em terra de Santa Cruz. - ”Comentando o Gen. Purper Bandeira. Editor de Opinião do Clube Militar, 26 de março de 2018” A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, enviou pedido ao STF solicitando a reabertura do caso Rubem Paiva. Na mesma linha de revisão do passado, uma juíza de Minas Gerais determinou que as praças e ruas internas das vilas militares da área sob sua jurisdição tenham seus nomes trocados, no caso de homenagearem autoridades ou combatentes que lutaram e evitaram que nos tornássemos uma grande e miserável Cuba. - Seria de bom grado e honesto por parte dessa procuradora-geral e da juíza de Minas Gerais, que elas também promovessem a reabertura do caso do soldado Mário Kosel filho, antes de substituir o nome daquela avenida em São Paulo em homenagem a ele. Ele foi morto covardemente e cruelmente quando prestava o serviço militar obrigatório. Se elas tivessem um filho nessas condições de morte, saberia muito bem como é a dor dos pais dele até os dias de hoje e sempre. - Em Cuba não foram erguidas estátuas de Fidel, e tampouco se batizou algum espaço público em sua homenagem. Isto foi a pedido do próprio falecido: ele sabia bem quem foi e por isso acovardou-se em vida e fez esse pedido possivelmente para evitar o escárnio e ofensas ao seu nome, após a sua morte. Tipos de gente que infelizmente aqui no Brasil fazem homagens a personagens como Ernesto Che Guevara, Carlos Mariguela, e outros, deveriam também fazer a Joseph Goebbels, uma vez que eles se interessam mesmo é só pela mentira.

Sobre o Autor

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Coronel R1 Paulo Roberto da Silva Gomes Filho

CURRÍCULO
Oficial de Cavalaria, da reserva remunerada, do Exército Brasileiro, da turma de 1990 da AMAN. Mestre em Operações Militares pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME 2008). Especialista em História Militar pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL 2010). Mestre em Estudos...

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