Em 28 de outubro de 2016, por meio de Portaria do Comandante do Exército, recebi uma das missões mais gratificantes da minha carreira de Oficial do Exército Brasileiro: implantar uma assessoria para operações de paz em Angola, país-irmão do continente africano.
Angola penetra no interior da África Austral até a fronteira com a Namíbia, com o Botswana, com a Zâmbia e com a República Democrática do Congo. Seu território está limitado a Oeste pelo Oceano Atlântico.
Vestígios encontrados nas regiões das Lundas, do Congo e do deserto do Namibe atestam que o território angolano já era habitado na Pré-História (período da vida da espécie humana anterior à invenção da escrita, com duração aproximada de 3.500 anos). Milhares de anos mais tarde, aquelas terras receberam povos mais organizados socialmente: os “Bochames”, exímios caçadores, de estatura pigmóide e de cor acastanhada e os “Bantus”, que vieram do norte, atual República dos Camarões, especialistas nos domínios da metalurgia, cerâmica e agricultura. A instalação dos Bantus transcorreu ao longo de muitos séculos, dando origem a diversos grupos que se estabilizaram em distintas etnias, cerca de noventa, e que perduram até os dias de hoje em Angola.
A colônia portuguesa de Angola formou-se, em 1575, com a chegada de Paulo Dias de Novais, primeiro governador português a chegar ao local com cem famílias de colonos e quatrocentos soldados, aproximadamente. Tinha como principais objetivos explorar os recursos naturais e promover o tráfico negreiro com outros países, incluindo o Brasil, formando um mercado interno e altamente lucrativo para Portugal.
O fim da monarquia portuguesa, em 1910, que foi acompanhado por uma conjuntura internacional favorável, contribuiu para que fossem realizadas importantes reformas no domínio administrativo, agrário e educativo da colônia. Angola passa a ser mais uma das províncias de Portugal (Província Ultramarina).
No segundo cartel do Século XX apareceram os primeiros movimentos nacionalistas, com o início da formação de organizações políticas mais explícitas, a partir da década de 1950. O poder colonial português não cedia às propostas desses movimentos, provocando, com isso, o desencadeamento de conflitos armados diretos, denominados de “Luta Armada”.
O período supracitado contou com a participação ativa de três grupos distintos: o Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA), fundado em 1956, apoiado pela extinta União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e por Cuba; a Frente Nacional para a Libertação de Angola (FNLA), revelada em 1961 e sustentada pelo Zaire e por mercenários portugueses e ingleses; e a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), que iniciou sua atuação em 1966 e era mantida pela África do Sul e pelos Estados Unidos. Posteriormente, a UNITA e a FNLA uniram-se contra o MPLA.
A independência de Angola do jugo português, ocorrida em 11 de novembro de 1975, marcou o início de um período de, aproximadamente, 27 anos de guerra aberta entre aqueles três grupos nacionalistas pelo controle do novo país africano. Eles foram apoiados por potências estrangeiras, o que conferiu ao conflito dimensões internacionais.
O Brasil, sob a presidência de Ernesto Geisel, foi o primeiro país a reconhecer a independência de Angola. Em 1976, a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu o governo do MPLA como legítimo representante de Angola.
A paz em Angola foi selada em 4 de abril de 2002, por meio de acordos assinados entre as partes beligerantes em Luena, Moxico, maior província, entre as 18 existentes em Angola. Mais de 80.000 soldados da UNITA entregaram suas armas e foram integrados à sociedade civil, às Forças Armadas Angolanas e à Polícia Nacional. Desde então, Angola vem buscando consolidar sua integridade territorial, a paz, a unidade e o bem-estar do seu povo, promovendo as devidas reformas econômicas, políticas e sociais do Estado.
A Assessoria Militar Brasileira para Operações de Paz junto às Forças Armadas Angolanas iniciou suas atividades no dia 1º de março de 2017, nas instalações da Direção de Operações (DOP), subordinada à Direção Principal de Operações (DPOP), do Estado-Maior General das Forças Armadas de Angola.
As Forças Armadas Angolanas têm priorizado o assunto “operações de paz” em seus planejamentos estratégicos de médio e longo prazo, a fim de que possam, efetivamente, participar em missões individuais e coletivas (contingentes) sob a coordenação da Organização das Nações Unidas.
A missão principal da Assessoria para Operações de Paz reside, prioritariamente, na contribuição com a elaboração de planejamentos para a operacionalização plena das estruturas de um Batalhão de Infantaria de Força de Paz; dos módulos aéreo, naval, Forças Especiais, Fuzileiros Navais e Hospital de Campanha (treinados, certificados e inseridos na Lista de Prontidão da ONU) e do Centro de Formação de Operações de Paz de Angola (CFOPA), o que corrobora a sua atuação junto ao Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas, como órgão de assessoramento estratégico para a execução das metas visualizadas por Angola.
O Exército Brasileiro, por meio de sua participação em diversas missões de paz, no passado, e por sua eficiente atuação em vinte e seis contingentes da Missão das Nações Unidas para Estabilização do Haiti (MINUSTAH), é tido como referencial internacional a ser seguido pelas Forças Armadas Angolanas, principalmente com relação à preparação de seus efetivos e pela excelência do Centro Conjunto de Operações de Paz do Brasil (CCOPBAB), haja vista que um dos objetivos propostos por Angola é a ativação de um Centro de Formação de Operações de Paz.
De acordo com a Política Nacional de Defesa (PND), o Brasil atribuiu ao continente africano – em especial aos países da África Ocidental e Austral, assim como aos de língua portuguesa, integrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) – uma elevada prioridade de relacionamento na área de Defesa, estimulando e buscando aprofundar seus laços de cooperação com esses países. A missão em tela carrega consigo essa grande oportunidade da parceria Brasil-Angola com relação às operações de paz.
O Brasil ao cooperar com os planejamentos estratégicos das Forças Armadas Angolanas, relativos à participação das mesmas em operações de paz sob a coordenação da ONU, alinha-se, certamente, ao Objetivo Nacional de Defesa de intensificar a projeção do País no concerto das nações e sua maior inserção em processos decisórios internacionais.
Atualmente, a Assessoria para Operações de Paz em Angola está em seu segundo ano de atuação, sendo que o próximo Assessor já foi nomeado para o período anual (2019). O planejamento estratégico realizado em 2017, por ocasião do início das atividades da assessoria, continua sendo aperfeiçoado e operacionalizado de acordo com as demandas propostas pelas Forças Armadas Angolanas.
A missão brasileira em destaque serve como importante vetor de visibilidade e propaganda do profissionalismo, da eficiência, efetividade e operacionalidade do Exército Brasileiro nos quesitos: planejamento estratégico; preparação de militares e contingentes para participação em operações de paz; e didática, aplicada pelo Centro Conjunto de Operações de Paz do Brasil (CCOPAB) por ocasião de seu alinhamento técnico-pedagógico com as estruturas de ensino existentes na ONU, projetando-o para o continente africano como um exemplo a ser seguido e copiado.
A Assessoria Militar Brasileira para Operações de Paz cumpre, atualmente, a importante função de divulgar e apresentar às Forças Armadas Angolanas um modelo de sucesso do Exército Brasileiro nos aspectos seleção, preparação e participação em operações de paz sob a égide das Nações Unidas. Ela tem contribuindo com o objetivo internacional do Exército Brasileiro de auxiliar na projeção de uma imagem positiva do Brasil no concurso das nações, particularmente, pela colaboração à paz e à segurança internacionais e pela participação em instâncias internacionais relevantes.
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